O mundo do futebol é cada vez mais diverso. Além da própria modalidade feminina que aumenta ano a ano, as arquibancadas hoje representam papel de luta por maior presença da mulher no esporte. E o crescimento de movimentos que debatem essas pautas já é uma realidade em praticamente todos os clubes do país.
Um grande exemplo disso é a Tribuna 77, torcida do Rio Grande do Sul que apoia o Grêmio Football Porto Alegrense.
Criada em 2012, a “Tribuna”, como é chamada pelos íntimos, sentia a necessidade de alçar voos mais altos para poder manter seus ideais acima de qualquer outra coisa.
Tribuna 77 em projeto social com crianças do bairro Humaitá. Foto: arquivo pessoal
Troquei uma ideia com a Tiele Kawarlevski, que faz parte da Tribuna 77 desde as primeiras vezes que pisou na Arena do Grêmio, e ela me contou um pouco sobre como o grupo prefere ser percebido nas arquibancadas.
“O lema da Tribuna é: ‘memória, identidade e cultura de Grêmio’, a nossa ideia é apresentar um Grêmio popular, acessível, anti-racista [...] Construir para a Instituição, tentar trazer essa representatividade que aqui tem um grupo de torcedores que lutam por essas causas, que representam um Grêmio do Catimba, do Everaldo, que debate e está ligado em todas essas coisas.”
“O que nos diferencia de outras torcidas do Grêmio é falar de política sem medo.”
Foto: arquivo pessoal
Nascida em Guaíba-RS e fanática pelo Tricolor desde a infância, a Tiele diz que sempre foi uma mulher independente, que não tinha medo de frequentar o estádio sozinha, mas que encontrou na torcida pessoas que defendem juntas as causas progressistas que faziam parte da sua vida.
O nome da torcida veio da própria arquibancada onde assistem os jogos, a Tribuna. Já o 77 é um número extremamente marcante na história do Grêmio: foi quando Hélio Dourado, presidente tricolor que hoje dá nome ao CT da base gremista, fez seu primeiro mandato. Além disso, é o ano de fundação da Coligay, considerada a primeira torcida LGBTQIA+ do país. Se não bastasse, foi em 1977 que se encerrou a hegemonia do Internacional no Campeonato Gaúcho, com o título do Grêmio marcado pelo gol de André Catimba.
Homenagem da Tribuna 77 a Volmar Santos, criador da Coligay. Foto: arquivo pessoal
“O que nos diferencia de outras torcidas do Grêmio é falar de política sem medo. Não é que não existam outras pessoas que pensem como a gente, o problema é que gera um medo de ser confundido com política partidária, de misturar Grêmio com outras bandeiras”, conta Tiele.
Diferente de outras torcidas do clube, a Tribuna 77 faz questão de se posicionar politicamente acima de qualquer receio com julgamentos. E isso é que vemos na arquibancada quando a torcida está presente: bandeiras LGTBQIA+, trapos antifascistas e faixas exaltando ídolos negros do Grêmio. Junto com isso, é claro, muita festa e apoio ao time.
Foto: arquivo pessoal
“Aqui não! Aqui não vamos deixar tu ser um escroto.”
Mais para o final da conversa, perguntei se ela, como mulher, se sentia segura no setor do estádio onde frequentam: “Totalmente! Na Arena, tirando os jogos grandes com pessoas que nunca frequentam, não costuma ter ataques a mulheres. Já aconteceu LGBTfobia, quando usamos a bandeira do arco-íris o pessoal chegou a questionar. As poucas vezes que aconteceu com mulheres foram com torcedoras fora do nosso grupo, e nos posicionamos. Fomos em direção e dissemos “aqui não! Aqui não vamos deixar tu ser um escroto”.
Foto: arquivo pessoal
A Tribuna 77 e outros grupos gremistas que levantam a bandeira da diversidade têm papel importantíssimo na transformação do ambiente do futebol. É um recado também ao clube, como num convite a ser sempre um aliado no combate ao machismo, racismo e LGBTfobia, principalmente quando institucionalmente replica o lema: “O Grêmio é clube de todos”.