
No fim de uma das tardes mais quentes do ano na cidade de São Paulo, dois meninos assinaram um contrato com a categoria sub-20 da Portuguesa, um dos clubes mais tradicionais da capital. Aliás, foi na casa histórica da Lusa, no Canindé, que Léo e Neném jogaram por mais de uma hora para decidir um campeonato que na maior parte do tempo acontece longe das câmeras de TV, mas ganhou novos significados desde que começou a aparecer na telinha.
“Visibilidade para minha favela”
essa frase foi repetida por jogadores que deram entrevistas para a Rede Globo.

Mesmo existindo desde 2012, a partir de 2019, a competição que começou no Rio, chegou na capital paulista e na primeira edição ganhou o caráter forte de oportunidade que tem hoje. Com transmissão ao vivo pela TV aberta das finais, o torneio que já havia revelado jogadores para o futebol profissional de elite no Brasil, tornou-se uma chance de garotos e garotas mostrarem o que podem fazer em campo durante uma hora e tentar adentrar no mundo do futebol depois de enfim “serem vistos”.
Com tantas histórias de superação entre as maiores estrelas do futebol brasileiro, existe a ideia de o futebol ser um esporte absolutamente democrático e meritocrático. Uma teoria que mostra fragilidade inclusive no senso comum, já que praticamente todos conhecem um “menino ou menina lá do meu bairro que era mais talentoso que muito profissional”.

A Taça mudou esse paradigma. Entre a modalidade masculina só são permitidos meninos que comprovem residência em cada uma das suas favelas. A seleção precisa ser feita da forma que o time represente mais fielmente possível aquela quebrada e impulsiona dois fatores que se afastaram do futebol profissional mas que fazem esse esporte ser justamente o mais popular do mundo.
O primeiro é o do holofote que é jogado no fator social da montagem desse time. Com muitas comunidades carentes de necessidades básicas, alguns atletas representam esse recorte e, para participarem de uma empreitada esportiva, precisam ter essas necessidades sanadas. Não são só atletas, são meninos e meninas e suas famílias que são auxiliados por meio da CUFA, que organiza o evento e nasceu justamente para ter acesso a esses casos e mudar a vida das pessoas na comunidade.

Um projeto que só é possível por meio de parceiros que fazem parte da iniciativa privada mas cumprem um papel social importante. A Friboi, como patrocinadora master da competição, marca presença em todas as fases do torneio e se envolve com todas as comunidades participantes, sendo peça fundamental para que projetos como esse tenham impacto e a estrutura que merecem.

O segundo é enxergar o esporte como um meio e não como um fim. Apesar de ser uma competição, são 104 favelas no masculino e 40 favelas no feminino construindo as próprias equipes, treinando e participando à sua maneira para só duas delas entrarem no palco onde só uma será vitoriosa. Não tem como ser sobre o troféu.
No país do futebol onde vencer (a partida) é sinônimo de sucesso, é complicado encontrar as palavras que resumem as equipes que ficam pelo caminho, já que derrota e fracasso estão a quilômetros de uma boa definição para esse caso.

Ao fim da tarde de sábado (18), o Campanário Diadema deu um show liderado pela craque Baratinha e foi campeão da categoria feminina. Na masculina, a mesma Campanário, favela na beira da Rodovia dos Imigrantes na zona sul de São Paulo, perdeu para Cidade Tiradentes, bairro no extremo leste da capital paulista.
O super prêmio antecipado para os dois atletas que assinaram seu contrato com a Portuguesa foi comemorado como a cereja do bolo. Mas com os nomes gritados pela torcida e elenco formados pelos seus vizinhos, a realidade mostra que o anseio está mesmo no churrasco de comemoração.
