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13 de fev. de 2023

“Criado pelos pobres, roubado pelos ricos”:
as torcidas se movimentam por um futebol mais popular

A semana foi de manifestações nas ruas e nos estádios contra os preços abusivos dos ingressos.

por

Artur Magalhães

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Na geografia existe um conceito básico denominado ‘gentrificação’. Por definição, gentrificação é o processo de transformação de áreas urbanas que leva ao encarecimento do custo de vida e aprofunda a segregação socioespacial nas cidades. Ou seja, aumentam o custo do lugar e quem não pode pagar pela nova realidade é obrigado a deixá-lo. O futebol, como um espelho da nossa sociedade, também passa por isso e qualquer semelhança não é mera coincidência.


Sendo tratado pelos cartolas cada vez mais como um produto, os torcedores passam a ser consumidores e o jogo se torna elitizado. Os estádios são substituídos por arenas, as arquibancadas de concreto são substituídas por confortáveis poltronas e a famosa geral nem existe mais. E o resultado de tudo isso é um só: o povão do lado de fora do espetáculo.


Com toda essa elitização e arenização, os custos aumentam e, da mesma forma, quem não pode arcar com isso - o torcedor - que se vire, assista seu clube pela TV.


"O FUTEBOL É PARA MIM E PARA VOCÊ, NÃO PARA A PORRA DA TV PAGA". REPRODUÇÃO.

Mas, assim como na sociedade, no futebol também existe a organização popular para resistir ao processo de higienização social e reivindicar seus direitos. Os protestos nas arquibancadas e nas ruas contra os preços abusivos dos ingressos têm sido cada vez mais frequentes no Brasil e no mundo. Os valores do ticket só aumentam e as manifestações crescem na mesma medida.


Na Inglaterra, torcedores do Liverpool e do Arsenal se uniram horas antes do confronto entre os times e protestaram sobre os altos preços de ingressos cobrados pela liga.



Já a torcida do Bayern de Munique chegou a fazer alusão à fortuna do Neymar em uma faixa que reclamava sobre os valores cobrados na Champions League: “não somos o Neymar, os tickets devem ser razoáveis”. Em outro momento eles jogaram notas falsas em campo para chamar atenção para a causa.


REPRODUÇÃO.

Aqui no Brasil, é possível que todos os clubes que passaram pela Série A deixaram, em algum momento, seus torcedores inconformados com esse problema, fazendo com que tivessem que se juntar para protestar.


A torcida do Flamengo, por exemplo, protestou com faixas, cartazes, notas em redes sociais e cantando no estádio em diversas ocasiões, desde jogos nacionais a partidas de Libertadores.


PROTESTO DE UM TORCEDOR FLAMENGUISTA, EM 2018. @_PPMOREIRA.

A do Palmeiras, que também costuma se manifestar com certa frequência sobre isso, sentiu um pouco mais o peso da elitização quando, depois da inauguração da sua nova arena e dos aumentos absurdos nos preços dos ingressos, viu uma das ruas mais famosas para festa de torcedores que não tinham grana para entrar no estádio ser fechada pela polícia com o apoio do clube.


REPRODUÇÃO.

No protesto mais recente sobre ingressos caros, a Gaviões da Fiel e outras organizadas do Corinthians foram até a porta da Federação Paulista na última sexta-feira (13) para pressionar por ingressos com valores minimamente acessíveis. Na estreia do Campeonato Paulista, o RB Bragantino cobra R$100 pela entrada no setor visitante destinado aos corinthianos.


Com bandeiras, faixas e sinalizadores, as organizadas tomaram as ruas e exigiram seus direitos. Em nota, a Fiel denunciou:


“Não concordamos com os valores abusivos e estamos pacificamente protestando contra isso e também exigindo providências da Federação.
Precisamos deixar claro que somos povo, e os valores não condizem com a realidade em que vivemos.”

A Federação Paulista se defendeu. A entidade alega não ter interferência no valor dos ingressos praticados pelos clubes e disse estar sempre atenta às demandas dos torcedores e buscando o diálogo com os mesmos. A FPF realmente não determina especificamente os preços dos ingressos, mas é ela que exige que exista um valor mínimo para as entradas de R$40.


Confira algumas fotos do ato:


VINICIUS BAADER/@MEIACANCHAFC
VINICIUS BAADER/@MEIACANCHAFC
VINICIUS BAADER/@MEIACANCHAFC
VINICIUS BAADER/@MEIACANCHAFC

VINICIUS BAADER/@MEIACANCHAFC
VINICIUS BAADER/@MEIACANCHAFC
VINICIUS BAADER/@MEIACANCHAFC

Do outro lado da história, os dirigentes não parecem se comover tanto com os protestos. Alguns, como o Alexandre Kalil, presidente do Atlético-MG por dois mandatos, deixam bem claro o que pensam sobre o tema:


“No mundo inteiro, futebol não é coisa para pobre. Doa a quem doer. Ingresso é caro em todo lugar. Torcida dividida e entrada a preço de banana estragada só existem no Brasil. O Atlético coloca ingresso a 20 reais e não lota o estádio. Futebol não é público, não é forma de ajuda social.”

O futebol é a maior paixão do país e a ideia é de que ele deve ser sempre acessível àqueles que ajudaram e ajudam a construí-lo. Se o torcedor não abandona o clube na má fase, na degola, na catástrofe financeira, na zona de rebaixamento ou em qualquer outro momento, as instituições não podem abrir mão desse torcedor. O clube de futebol é a grande paixão de milhões de brasileiros, e a relação de entrar no estádio é como a de visitar um parente amado. No estádio o torcedor se sente em família, e é aquilo que diz Mano Brown: nada deixa um homem mais doente que o abandono dos parentes.

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